sábado, outubro 21, 2017

Comparar o incomparável


Como disse e bem Sérgio Conceição na conferência de imprensa de ontem, um treinador é que toma as decisões. E se as entende justificar ou não, obviamente é uma questão da sua consciência. No entanto, o treinador do líder da Liga NOS errou, e a dobrar.

Em primeiro lugar porque a necessidade de justificar a decisão não se prende com o interesse dos jornalistas, mas sim com o facto destes traduzirem aquilo que é o interesse do público. Não haverá certamente um adepto dos dragões que não se questione porque Casillas foi para o banco, quando nada o fazia prever. Os jornalistas não são mais do que um veículo de comunicação, neste caso entre os adeptos do Porto, e do futebol em geral, e o treinador dos azuis e brancos. Caso não tivesse justificado a decisão (fê-lo de forma pouco clara, ainda assim) estaria a ignorar os seus adeptos e esses não pode, nem deve, ignorar ou deixar de procurar fazer-se entender junto deles.

O segundo e maior erro que cometeu foi querer justificar a sua decisão comparando-a com a situação que se passa num rival. Referir que Júlio César também está no banco e tem 26 títulos não é mais do que o discurso do coitadinho, a mim apontam o dedo e ao treinador do Benfica não. Obviamente ninguém pode apontar o dedo a Rui Vitória por tirar um guardião veterano, que claramente já não está em condições físicas de continuar a exercer a profissão e cuja qualidade decresceu de forma assustadora nos últimos dois anos, lançando-se a questão de ser o exemplo de um jogador que não sabe sair por cima e acabará a carreira como alguém que nos últimos tempos apenas se arrastou nos relvados.

Já Casillas é um guarda-redes veterano em pleno nas suas capacidades. Que pelo menos no ano passado e neste foi um bastião da segurança defensiva da sua equipa. E que pelo rendimento em campo (é impossível avaliar a postura nos treinos ou fora do campo pois aí entramos num campo privado ao qual não temos acesso) não há a mínima justificação para proceder à sua substituição. Ainda para mais num momento em que o Porto está a dominar a Liga NOS e estava com uma prestação equilibrada a nível da Liga dos Campeões, com tudo em aberto em termos de passagem à fase seguinte (que se mantém, contudo).

Também a comparação entre José Sá e Mile Svilar, pela diferença de tratamento da comunicação social aos dois erros dos guarda-redes dos dois candidatos ao título, é um péssimo exemplo de Sérgio Conceição, mais uma vez para sacudir água do capote quando não tinha que o fazer se tivesse sabido argumentar a decisão que tomou.

É óbvio que o tratamento a um jovem de 18 anos que fez na quarta-feira o segundo jogo da sua carreira de profissional não pode ser igual à de um guarda-redes de 24 anos, que tem cerca de 30 internacionalizações nos últimos dois escalões antes da Seleção A, mas ambos já seniores, escalões onde jogou 4 jogos num Mundial sub-20 e 5 jogos num Europeu Sub-21, onde Portugal até foi finalista vencido. E que tem três épocas de Liga NOS, ainda que nunca tenha sido titular indiscutível do Marítimo. A que se juntam três anos de utilização regular na equipa B dos insulares na Segunda Liga, onde somou 75 jogos, mais 17 na equipa secundária do FC Porto, na mesma divisão.

Tudo somado, a comparação roça o absurdo e não é mais do que a continuação do estilo de comunicação do FC Porto ao longo dos últimos meses, infelizmente um péssimo exemplo de como se faz comunicação, em que se fala mais da casa do vizinho do que da própria casa.

Concorde-se ou não com a decisão, Sérgio Conceição é soberano e ninguém pode questionar a decisão e muitos menos os motivos da mesma. A única análise que pode ser feita é sobre se José Sá poderá manter o nível defensivo dos dragões semelhante ao que tem revelado desde a temporada transacta. A minha opinião é que não. Um guarda-redes é muito mais do que o último elemento de uma equipa e as suas características são decisivas para a forma como a equipa joga.

Aí sim um bom exemplo é olhar para o rival da Luz. Com Svilar já se percebeu que a defesa pode voltar a jogar subida, dando menos espaço entre linhas, com os sectores mais próximos e coesos. O inverso do que se verificou com Varela e Júlio César, ambos sem capacidade para serem o líbero da defesa, protegendo a profundidade nas costas da linha defensiva dos encarnados.

José Sá e Casillas até podem não ser tão diferentes a este nível, mas o capital de confiança da defesa no internacional espanhol é muito diferente do internacional sub-21 luso. Isso foi gritante em Leipzig, com a defesa a cometer erros que não são habituais nos azuis e brancos. E certamente o erro inicial de Sá que originou o golo dos alemães não aumentou esse fraco capital de confiança no guarda-redes curiosamente formado na Luz.

Se a opção é para contunuar ou não, saberemos dentro de poucas horas quando sair a constituição do onze do FCP frente ao Paços de Ferreira, mas seria mais difícil ainda de entender se voltasse a apostar em Casillas.

sexta-feira, outubro 20, 2017

O leão que perdeu o apetite


Ao longo das últimas semanas, a crise, ou fase menos boa como lhe chama Rui Vitória, do Benfica tem enchido títulos e manchetes de jornais, ocupado horas nas TV's e rádios e tem sido um fantástico escape para a menor atenção que é dada ao rival da Segunda Circular.

Mas a verdade é que os leões parecem mergulhados numa crise de apetite de golos ao longo do último mês. Em cinco dos últimos cinco jogos, ficaram em branco em três (Marítimo para a Taça CTT, Barcelona na Champions e Porto na Liga NOS) e noutras duas ocasiões apenas chegaram ao golo graças a autogolos (Moreirense na Liga NOS e Juventus na Champions). O outro jogo foi com o Oleiros para a Taça de Portugal, que obviamente não deve ser levado em linha de conta dada a fragilidade competitiva do rival e pelo facto do Sporting nem ter apresentado o seu onze base.

O motivo mais claro para perceber esta falta de produção ofensiva dos de Alvalade prende-se com a pouca capacidade goleadora de Bas Dost face ao que apresentou na temporada anterior. O avançado holandês tem quatro golos na Liga NOS, mas dois são de penalty. Apenas em Guimarães bisou sem nenhum dos golos a surgir da transformação de uma grande penalidade. E a estes golos soma apenas mais um em Bucaresta no playoff da Champions. Muito pouco para quem lutou pela Bota de Ouro até ao último segundo com Messi em 2016/017.

A questão que fica é se se trata de um período de menor fulgor do avançado holandês ou se o jogador está a ser vítima do novo sistema. Aposta mais na segunda. Várias vezes aqui escrevi que a saída de João Mário desequilibrou a equipa gravemente no ano passado. Gelson Martins substituiu o médio do Inter dando outro rasgo ofensivo e capacidade de desequilibrar na frente, através da técnica e da velocidade, mas deixou os leões desequilibrados defensivamente, deixando de ter um terceiro médio a fazer movimento interiores, o que condenou Bryan Ruiz ao desterro a que se encontra envolvido atualmente.

Por isso, Jesus teve como principal preocupação este ano recuperar a eficácia defensiva que lhe custou a ambição de lutar por mais há um ano. Mas essa eficácia não só está consolidada, como se pode ver pelos golos que sofreu de rajada em alguns jogos, como em Santa Maria da Feira ou em Atenas, como surge não só à custa da introdução de novos elementos no quarteto defensivo, mas também à alteração do meio-campo.

Acuña veio fazer o que João Mário fazia em termos de equilíbrios, no flanco contrário, mas a saída de Adrien encurtou a equipa no corredor central. Mais ainda quando o treinador dos verde-brancos começou a apostar em William para 8 e Battaglia para 6. Ambos são muito curtos em termos de condução e transporte, assim como na capacidade de passe. A isto junta-se Bruno Fernandes, um jogador muito distinto de Teo Gutierrez, Bryan Ruiz ou Alan Ruiz. O médio português é mais um 10 que um 9,5 como Jesus gosta de chamar a quem joga junto do seu ponta-de-lança. Esse facto entrega também mais à marcação Bas Dost, com menos jogadores a surgirem na área para abrir espaços para o gigante do país das túlipas.

Ora a menor eficácia dos leões coincide também com o desaparecimento da lista de marcadores de Bruno Fernandes. O jogador que chegou de Itália foi um verdadeiro bombardeiro ao longo de várias jornadas, inscrevendo quase sempre o seu nome na lista de marcadores de cada partida. Algumas delas que até abriram com um golo seu para tornar jogos teoricamente difíceis em menos complicados, como a deslocação à Cidade-Berço.

O Sporting revela muitas dificuldades no jogo interior no último terço e obviamente que nem sempre iria surgir a bomba de Bruno Fernandes para resolver. Os jogos em casa dos leões para a Liga NOS e mesmo no Playoff da Champions são o melhor exemplo dessas dificuldades. Jogos com poucos golos, onde o Sporting foi incapaz até à data de marcar mais do que dois golos num jogo no Estádio José de Alvalade. Em sete partidas no covil do leão para as várias competições, o pecúlio é confrangedor. Apenas cinco golos marcados e esta soma refere-se apenas a três jogos (1 golo ao Setúbal, 2 ao Estoril e 2 ao Tondela) com quatro jogos em branco (Steaua, Marítimo, Barcelona e Porto)! É certo que os jogos com os catalães e os dragões são de elevadíssimo grau de dificuldade, mas são nulos ofensivos a mais para uma equipa com as ambições do Sporting.

Na minha opinião, para mudar esta fase menos concretizadora, a única hipótese será recuar Bruno Fernandes para 8, tirar Battaglia, e colocar alguém mais próxima de Bas Dost, seja Podence, Gelson Dala ou Iuri Medeiros. Curiosamente, a melhor opção até parece ser Bryan Ruiz, mas o costa-riquenho não parece ter hipótese de deixar o ostracismo a que foi vetado.

Os números não mentem, e não fossem dois penalties (bem assinalados diga-se) salvadores nos descontos com Setúbal e Feirense, e apesar da enorme crise exibicional que o tetracampeão tem vindo a apresentar, o rival da 2ª Circular poderia estar atrás dos encarnados, sem que se leia uma linha de qualquer especialista sobre esta outra crise de um grande de Lisboa... Seguem-se quatro jogos de enorme grau de exigência (Chaves, Juventus e Braga em Alvalade e Rio Ave fora, entre Chaves e Juventus), onde os leões terão de dar uma resposta cabal a este momento pouco convicente, sob pena de hipotecarem uma temporada onde, mais do que ninguém têm obrigação de ser campeões dado o elevadíssimo investimento em contratações e salarial, muito superior aos dos rivais que lutam pelo título.